segunda-feira, janeiro 31, 2011

Arte: Marcin Bondarowicz

da indiferença das cigarras

Cigarras anunciam
um verão que nunca esqueci,
em bosques que já não existem

nunca mais o aroma silvestre
da minha infância

nunca mais o barulho do riacho
e nem noites de vaga-lumes

cigarras cantam indiferentes
às lembranças que o poeta resgata
do seu baú de afetos.

© Ademir Antonio Bacca
do livro “Gritos por dentro das palavras”
Arte: Restrepo
“Precisamos tomar cuidado para não fazer
do intelecto o nosso deus.
Ele tem músculos poderosos, é verdade,
mas não tem nenhuma personalidade.”

ALBERT EINSTEIN
1879 - 1955
daquele tanto que meus olhos já viram

por estes olhos
que a vida um dia
há de fechar
já passaram sonhos
tantos
que até dá gosto
de se contar

mas
por estes olhos
que ainda têm
muito por chorar
já passou também
tanta morte
que nem é bom
de se lembrar

© Ademir Antonio Bacca
Arte: Gomila Agustin
“Quando os escritores morrem,
eles se transformam nos seus livros.
O que, pensando bem,
não deixa de ser uma forma interessante
de reencarnação.”

JORGE LUIS BORGES
1899 - 1986
rio quarenta graus

água
pedra
terra
sonhos
vida
morro
abaixo

a
morte
dói
mais
quando
não
chega
de
bala
perdida
ou
na
ponta
de
faca

© Ademir Antonio Bacca
Arte: Baptistão
“Escrever é gravar reações psíquicas.
O escritor funciona qual antena
– e disso vem o valor da literatura.
Por meio dela,
fixam-se aspectos da alma dum povo,
ou pelo menos instantes da vida desse povo.”

MONTEIRO LOBATO
1882 - 1948
nada sei do mar
que não histórias de pescador

também pouco sei dos segredos
do ir e vir das suas águas
em ondas que molham meus pés

mas o canto das sereias
conheço bem:
me deixo enganar por ele
desde que meus olhos
viram o mar pela primeira vez

© Ademir Antonio Bacca


ACASO

ANTOINE DE SAINT-EXUPÉRY
1900 – 1944

Cada um que passa em nossa vida,
passa sozinho, pois cada pessoa é única
e nenhuma substitui outra.

Cada um que passa em nossa vida,
passa sozinho, mas não vai só
nem nos deixa sós.

Leva um pouco de nós mesmos,
deixa um pouco de si mesmo.
Há os que levam muito,
mas há os que não levam nada.

Essa é a maior responsabilidade de nossa vida,
e a prova de que duas almas
não se encontram ao acaso.

sábado, janeiro 29, 2011

Arte: David Levine

“A vida me deu tudo que pedi,
mas se o que eu pedi foi muito pouco,
aí é problema meu.”

JEAN PAUL SARTRE
1905 - 1980
tem noites
que a saudade
arranca máscaras
com precisão cirúrgica

outras,
com a delicadeza
de um boxeador.

© Ademir Antonio Bacca

terça-feira, janeiro 11, 2011

Arte: Charito Gil “Virtuelle aus dem superrechner”

das trocas

não troco
minhas dúvidas
pelas tuas certezas
nem minhas fantasias
pela tua realidade
mas troco
o mar dos teus olhos
pelo cais do meu corpo.

© Ademir Antonio Bacca
de “”Poesia do Brasil” – Volume 12
Imagem: Elena K "Easter in Sofia"

tatuagem

a poesia
tem essa
de tatuar
a alma
de emoções

© Ademir Antonio Bacca
de “”Poesia do Brasil” – Volume 12
Arte: Tonio

"A alma nasce velha e se torna jovem.
Eis a comédia da vida.
O corpo nasce jovem e se torna velho.
Eis a tragédia da alma."

OSCAR WILDE
(1854-1900)
nem
sempre
a
palavra
é
algodão
entre
os
cristais

© Ademir Antonio Bacca
de “”Poesia do Brasil” – Volume 11
Arte: Andres Cascioli

“O mundo se divide em pessoas boas e más.
As boas têm um sono tranqüilo.
As más se divertem muito mais.”

WOODY ALLEN
querer amar (eu e você)

©MARISA LY

eu não sei amar...
se soubesse, estava amando
com unhas e dentes

não sei pensar sobre o amor
porque penso que ele deveria ser
como o ar que respiro

não sei dizer dele senão vida,
existência... não sei dizer dele
além de senti-lo nas veias

das coisas todas que aprendi
entre medos e desordem
entre faltas e ausências
entre silêncios imensos
não aprendi a amar...

porque amar, não sei...
algo me diz que amar não tem que aprender
algo me diz que amar é maior
algo me diz que amar é... ser!

e, no entanto, amar
de repente
pode ser mais simples!
amar pode ser apenas querer!

antes que cante o galo
antes que toque o sino
antes que feche a porta
antes que a boca cale
antes que o corpo pare

antes que o coro desafine
antes que a paixão naufrague
antes que o tempo acabe
antes que o gatilho dispare
antes que o cálice transborde

antes que a chama da vela apague
antes que o cio acabe
antes que vida falhe
antes que o relógio desperte
antes que a estrada acabe
é bom que um de nós fale

© Ademir Antonio Bacca
de "Poesia do Brasil” – Volume 12