sábado, fevereiro 11, 2012

Foto: Acervo pessoal

Neve na Europa? 
Não, em Serafina Corrêa

Numa época em que nevascas raramente vistas tem provocado grandes estragos no leste europeu, meus olhos pousaram sobre esta foto sob o tampo de vidro da minha mesa de trabalho. Ela registra a grande precipitação de neve ocorrida, talvez a maior do século passado, na serra gaúcha em 1965. A cidadezinha em questão, com ares europeus, é Serafina Corrêa, minha terra natal, em flagrante colhido no dia 20 de agosto daquele ano. Não presenciei o espetáculo da natureza em Serafina, pois já estava morando em Bento Gonçalves, mas lembro perfeitamente que aqui as aulas do Mestre Santa Bárbara foram suspensas devido aos riscos de desabamento do teto da velha escola devido ao acumulo de neve.
Arte: "Evaporare da lacrime di gomma" © Daniele Manfredini
moagem

trituro
grãos de afeto
colhidos
em campos insones
em busca
de farinha mágica
que alimente
meus dias
de ausências

© Ademir Antonio Bacca

do livro “O grito por dentro das palavras”
Arte: Netto

No fim tu hás de ver que as coisas mais leves
são as únicas
que o vento não conseguiu levar:
um estribilho antigo
um carinho no momento preciso
o folhear de um livro de poemas
o cheiro que tinha um dia o próprio vento...

MARIO QUINTANA

1906 - 1994

nostalgia

um velho acendedor de lampiões
perambula em minha insônia
por madrugadas que nunca vivi
a iluminar velha lembranças
que não desgrudam de mim

© Ademir Antonio Bacca
Arte: Restrepo

Se sou amado,
quanto mais amado
mais correspondo ao amor.

Se sou esquecido,
devo esquecer também,
Pois amor é feito espelho:
- tem que ter reflexo.

PABLO NERUDA

1904 - 1973

dos humores da vida

tem dias
que a vida
se arma
até os dentes:
espalha sangue
nas páginas dos jornais
e vira tudo de pernas pro ar

mas tem dias
que ela se desmancha
em poesia
e pinta o céu
de um azul
que sei ainda existir
no fundo dos teus olhos tristes

© Ademir Antonio Bacca

do livro “O grito por dentro das palavras”
Arte: Omar Zevalos

“A cultura vale riscos altos.
Sem cultura, somos todos
bestas totalitárias.”

NORMAN MAILER

1923 – 2007

 
tem gente – canto três

tem gente que abre o corpo em velas
tem gente que não conhece os caminhos do mar
tem gente que não vai pra frente
tem gente que desafia o coro dos contentes
tem gente que é alquimista
tem gente que pensa que é artista
tem gente que não se enxerga
tem gente que o trem não pega
tem gente que vive na boemia
tem gente que detesta poesia
tem gente que só entra de sola
tem gente que tira coelho de cartola
tem gente que pensa que é gente
tem bicho que é melhor do que gente

© Ademir Antonio Bacca

do livro “O grito por dentro das palavras”
Arte: Mark Summers

"Chegará o dia em que os homens 
conhecerão o íntimo dos animais, 
e, neste dia, 
um crime contra um animal 
será considerado um crime contra a humanidade".

Leonardo da Vinci

(1452-1519)

tem gente – canto dois

tem gente que tem fome de saber
tem gente que não sabe de nada
tem gente que não mostra a cara
tem gente que só mostra os dentes
tem gente que voa no trapézio de olhos fechados
tem gente que só atravessa a rua com os dedos cruzados
tem gente que acende uma vela pra cada santo
tem gente que ajoelha e não reza
tem gente que só viaja de primeira
tem gente que devia andar de coleira
tem gente que é duro na queda
tem gente que morre com tiro de festim
tem gente que tem medo do escuro
tem gente que ilumina a noite com um pote de vagalumes

© Ademir Antonio Bacca

do livro “O grito por dentro das palavras”

quarta-feira, fevereiro 01, 2012

Foto: © Agencja Gazeta

Morre a poeta Wislawa Szymborska, 
Nobel de Literatura de 96

A poetisa polonesa Wislawa Szymborska, vencedora do Prêmio Nobel de Literatura em 1996, morreu nesta quarta-feira, 1º de fevereiro, aos 88 anos na Cracóvia vítima de um câncer de pulmão.
"Morreu em casa, tranqüila, enquanto dormia", disse à imprensa seu secretário pessoal, Michal Rusinek, lembrando que a escritora foi sempre um fumante incorrigível apesar das constantes advertências dos médicos.
Embora Wislawa, nascida em Kornik, no oeste da Polônia, em julho de 1923, fosse a poetisa mais conhecida da Polônia, teve que esperar até a concessão do Nobel em 1996 para que sua obra chegasse ao resto do mundo.
A autora destacou-se por uma poesia cheia de humor e pela habilidade em usar trocadilhos, presente desde seu primeiro poema publicado em um jornal local em 1945.

(Fonte: Jornal Folha de São Paulo On Line)