Morre o escritor e jornalista uruguaio Eduardo Galeano, aos 74 anos
Autor de 'As veias abertas da América Latina' estava internado por complicações decorrentes de um câncer de pulmão
by Andres Stapff / Reuters
Morreu na
manhã desta segunda-feira, aos 74 anos, o escritor e jornalista uruguaio
Eduardo Galeano, em Montevidéu. Ele teve complicações decorrentes de um câncer
de pulmão, diagnosticado em 2007, e estava internado no Centro de Assistência
do Sindicato Médico do Uruguai desde sexta-feira.
Galeano
escreveu mais de 50 livros (traduzidos para cerca de 20 idiomas), entre
documentários, ficções e obras jornalísticas, e tinha o futebol, as mulheres, a
cultura e o continente latino-americano como principais temas de interesse. Sua
obra mais famosa foi "As veias abertas da América Latina", que, desde
sua publicação, em 1971, se converteu em um clássico da literatura política do
continente. Entre os livros notáveis do uruguaio, está também a trilogia
"Memória do fogo".
"A
utopia serve para caminhar. Um sentido 'até sempre' para quem foi um mestre de
várias gerações", publicou, no Twitter, o senador e ex-chanceler do
Uruguai Luis Almagro. "A morte de Eduardo Galeano impacta e dói. Ninguém
pode preparar uma descrição tão poética do futebol quanto ele", comentou o
jornalista esportivo uruguaio Martin Charquero.
A
ex-senadora colombiana Piedad Córdoba Ruiz destacou o lado político do
escritor: "Os pobres do mundo perdem um de seus grandes defensores.
Descanse em paz, mestre Eduardo Galeano, e aqui seguiremos sua luta.
#Tristeza", postou.
Nascido
no dia 3 de setembro de 1940, aos 14 anos já vendia caricaturas para jornais de
Montevidéu. Nos anos 1960, como jornalista, trabalhou no semanário
"Marcha" e no diário "Época". Porém, antes de se tornar um
jornalista e líder intelectual da esquerda, Galeano trabalhou como operário de
fábrica, desenhista, pintor, office boy, datilógrafo, caixa de banco, entre
outras ocupações.
Por conta
do golpe militar uruguaio, Galeano deixou o país em 1973 e passou a morar na
Argentina, onde fundou uma revista cultural chamada "Crisis". Quando
voltou ao Uruguai, treze anos depois, criou o semanário "Brecha".
"Se
foi Eduardo Galeano, fundador e referência do nosso semanário, integrante do
Conselho Consultivo e colaborador assíduo de suas páginas", publicou o
perfil do "Brecha" no Twitter.
Nos
últimos meses, se dedicava a editar um novo livro chamado "Mujeres",
que será lançado na quinta-feira, na Espanha. Trata-se de uma seleção de contos
e relatos de Galeano dedicados a personagens femininos, sejam elas anônimas ou
mundialmente famosas (como Sherazade e Marilyn Monroe). A capa é ilustrada por
quatro esculturas artesanais feitas em Olinda e escolhidas por Galeano, que
também supervisionou a edição dos textos.
"A
única maneira para que a história não se repita é mantendo ela viva",
escreveu certa vez o uruguaio. Depois do exílio, se não estava viajando, era
fácil encontrar Galeano vagandos pelas ruas de Montevidéu ou sentado ao redor
de uma das mesas do Café Brasileiro, na Cidade Velha, onde ordenava suas ideias
ou participava de conversas com amigos e estranhos.
Em 2009,
durante a Cúpula das Américas, o ex-presidente da Venezuela, Hugo Chávez,
presenteou o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, com um exemplar do
livro de Galeano (censurado pelas ditaduras do Uruguai, Argentina e Chile). Por
conta da ocasião, em um dia, o livro pulou da 60.280ª para a décima posição na
lista dos mais vendidos da Amazon.
Questionado
sobre o episódio, Galeano respondeu que "nem Obama e nem Chávez
entenderiam o texto. Ele (Chávez) entregou a Obama com as melhores intenções,
mas lhe deu um livro em um idioma que Obama não conhece. Então, foi um gesto
generoso, mas um pouco cruel".
AUTOR
DIZIA QUE 'VEIAS ABERTAS' FICARA NO PASSADO
Galeano
lançou "As veias abertas da América Latina" aos 31 anos e reconheceu
posteriormente que ainda não tinha formação suficente para finalizar a tarefa
naquela época.
Uma prova
disso é que, durante entrevista coletiva em Brasília, em 2014, quando foi
homenageado pela 2ª Bienal Brasil do Livro e da Leitura, o autor surpreendeu a
todos ao manifestar publicamente algumas reservas em relação à sua obra.
"Eu não seria capaz de ler de novo esse livro, cairia desmaiado",
declarou, para espanto geral dos jornalistas presentes.
Segundo
registrou a jornalista Cynara Menezes em seu blog "Socialista
Morena", o uruguaio não poupou críticas ao conteúdo de "Veias
abertas", quatro décadas depois da sua primeira edição: "Depois de
tantos anos, não me sinto tão ligado a esse livro como quando o escrevi. O
tempo passou, comecei a tentar outras coisas, a me aproximar mais à realidade
humana em geral e em especial à economia política — porque 'As veias abertas'
tentou ser um livro de economia política, só que eu ainda não tinha a formação
necessária. Não estou arrependido de tê-lo escrito, mas é uma etapa
superada", complementou o autor, classificando a prosa de esquerda
tradicional de "chatíssima".
Leia mais sobre esse assunto em http://oglobo.globo.com/cultura/livros/morre-escritor-jornalista-uruguaio-eduardo-galeano-aos-74-anos-15856331#ixzz3XF0xOfZZ
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