quinta-feira, novembro 30, 2006

Arte: Van Oostzanen- bulls eye
Entrega

Eu sentia o barulho do mar,
mas não tinha mar ali

O brilho da lua refletia
sombras na parede,
mas não era noite de luar

Eu sentia teus lábios
percorrerem meu corpo
mas sabia que não era a tua boca
que me devorava

Eu sabia
que não tinha mar e nem luar
mas mesmo assim
me deixaria levar pela mão
até saciar minha sede
ou me afogar nos teus braços
porque a paixão
não pode ter meio termo
nem quando não passa
de mera fantasia.

© Ademir Antonio Bacca
do livro “Plano de Vôo”
Arte: David Levine
"A vida não é regida pela vontade ou pela determinação. A vida é um conjunto de nervos, fibras e células que se formam lentamente, onde se esconde o pensamento e a paixão sonha os seus sonhos."

OSCAR WILDE
16.10.1854 / 30.11.1900
feridas abertas

nem todas as lembranças sangram
nem todas as lembranças me tiram o sono

mas todas as lembranças doem.

© Ademir Antonio Bacca
do livro “Pandorgas ao Vento”

FERNANDO PESSOA

Nascido em 13 de junho de 1888, Fernando Pessoa publicou seu primeiro poema em 1913 (Impressões do Crepúsculo) e em 1914, surgiram os seus três principais heterônimos: Alberto Caieiro, Álvaro de Campos e Ricardo Reis.
Em 30 de novembro de 1935, morria aos 47 anos de idade, devido a complicações hepáticas. Com a publicação de sua obra completa, após a morte viria a se transformar no maior poeta da língua portuguesa dos últimos tempos.
“Vem sentar-te comigo, Lídia, à beira do rio.
Sossegadamente fitemos o seu curso e aprendamos
Que a vida passa, e não estamos de mãos enlaçadas.
(Enlacemos as mãos).

Depois pensemos, crianças adultas, que a vida
Passa e não fica, nada deixa e nunca regressa,
Vai para um mar muito longe, para o pé do Fado,
Mais longe que os deuses.

Desenlacemos as mãos, porque não vale a pena cansarmo-nos.
Quer gozemos, quer não gozemos, passamos como o rio.
Mais vale saber passar silenciosamente.
E sem desassossegos grandes.”

FERNANDO PESSOA (1888 – 1935)
haicai

tamborins batucando
na janela.
chuva de pedra

© Ademir Antonio Bacca
do livro “Pandorgas ao Vento”
armadilha

no
meio
do
verso
a
palavra
desavisada
rima
amor
com
desamor

© Ademir Antonio Bacca
do livro “Pandorgas ao Vento”


gran prix

todo bom poema
tem um poeta desesperado
em seu encalço

© Ademir Antonio Bacca
do livro “Pandorgas ao Vento”

Arte: Siegfried Zademack
Inquietação

no vértice
das tuas coxas
o desassossego permanente
das minhas fantasias

© Ademir Antonio Bacca
do livro “Pandorgas ao Vento”
a noite
que outrora abria
todos os meus horizontes,
agora se faz quieta
e me prende nos limites
da minha insensatez.

grade emocional intransponível
que me aprisiona
sem uma amarra sequer.

exílio que não acaba
com o primeiro cantar do galo.

© Ademir Antonio Bacca
do livro “Pandorgas ao Vento”

segunda-feira, novembro 20, 2006

Arte: Siudmak Wojtek
a um passo do paraíso

paixão que leva
do nada a lugar algum

sonho que insiste
em fugir pela janela
antes da hora

aromas da infância
esquecidos na dobra do tempo

segredos
que os olhos da amada
escondem

feridas que se abrem
em noites de ausências

velas abertas
à espera de vento
para se lançar ao mar

desejo que resiste
sobre as cinzas da paixão

o que separa o poeta
do paraíso
é só um passo no escuro.

© Ademir Antonio Bacca
do livro “O Relógio de Alice”

Arte: Mario Alberto

Na madrugada de sexta-feira, morreu um dos monstros sagrados do futebol de todos os tempos: Puskas. Húngaro de nascimento, depois de brilhar na seleção de seu país, fugiu da invasão soviética e exilou-se na Espanha, onde tornou-se um dos maiores ídolos do Real Madri. No domingo, jogadores perfilados no meio do campo, uma violoncelista executava sua música durante o minuto de silêncio em honra ao craque. Nas arquibancadas, a platéia em silêncio respeitoso. No Brasil, o minuto de silêncio sempre é o mais barulhento de toda a partida. Daí dá para se ter uma noção do nível de certos torcedores que vão aos estádios para tudo, menos para torcer pelos seus clubes civilizadamente
das águas que movem o moinho da saudade

o murmurar
das águas do rio
que corre ao longe
da minha infância
faz-se ouvir
na noite de saudades
do meu pai,
que se precipita em sombras
e silêncio

nada que não o correr
de águas mansas
que trazem lembranças
de trigais dançando ao vento
e da velha avó
resistindo ao peso dos anos

o murmurar
das águas do rio
da minha infância
atravessa a noite silenciosa,
remenda meus sonhos
de menino
e deságua no mar de saudades
que se forma nos meus olhos

© Ademir Antonio Bacca
do livro “O Relógio de Alice”


Arte: Self Awarelg © Jody Harmon

da minha poesia

sonhos
mal dormidos
que carrego
amarrotados
no bolso
do paletó

© Ademir Antonio Bacca
do livro “Pandorgas ao Vento”
cristal

sonhos
mal sonhados
também se espatifam
ao encontro do chão.

© Ademir Antonio Bacca
do livro “Pandorgas ao Vento”

Fractal 0011 © ademir bacca - Programa utilizado: Ultrafractal
quando
a vida
fica chata
tiro
um sonho
doido
da gaveta
e saio
pela noite
em busca
de poesia

© Ademir Antonio Bacca
do livro “Plano de Vôo”
da felicidade

os
teus
olhos
quebrando
o
silêncio
da
tua
boca

© Ademir Antonio Bacca
do livro “Plano de Vôo”

quarta-feira, novembro 15, 2006

Arte: Jacek Yerka

Os meus silêncios
muitas vezes valem ouro
e custam caro

horas de sono perdidas
pelas palavras não ditas

o que a boca não diz
nem sempre teus olhos
compreendem.

© Ademir Antonio Bacca
do livro “Pandorgas ao Vento”
muita vida
já me fugiu
por entre os dedos

muito sonho
bateu em minha porta
entrou e ficou
enquanto a vida
seguiu seu rumo

muito tempo
já gastei
correndo atrás
da emoção
de dar sentido
à vida.

© Ademir Antonio Bacca
Arte: Fraga

“para amar,
basta estar
distraído”


© GUIMARÃES ROSA
1908 - 1967
das faxinas

ao primeiro
cantar do galo,
recolho os cacos
das minhas emoções
mal dormidas.

© Ademir Antonio Bacca
do livro “Pandorgas ao Vento”
das perseguições

dos meus sonhos
mal dormidos
você é quem volta
com mais freqüência.

© Ademir Antonio Bacca
do livro “Pandorgas ao Vento”


Arte: CHEMA MADOZ

Rubro Cálice

Ao acariciar suavemente meu corpo
O frio desperta o aroma entre lençóis
Visto-me, confusa, de tua Saudade
E, inquieta, a alma sedenta de sensações
Leva-me sua prisioneira varietal
São passos aflitos, corredores de cristais
Desces adega em minhas escadas...
Um sabor ao brinde de uma paixão:
Bebo do bouquet de teus lábios
Ousando degustar sonhos-cabernet,
Aveludado ainda é teu gosto
E é inebriando-me de lembranças
Que me encorpo aos braços teus
Entre beijos-sauvignon...

© Thyene Preissler Scherer

* Este belíssimo poema foi-me enviado pela amiga Marisa de Moraes, a quem agradeço o prestígio que empresta a este meu cantinho

na solidão da tua ausência
descubro que a minha aquarela
é pouco para te pintar
do jeito que eu te vejo

© Ademir Antonio Bacca
do livro “Pandorgas ao Vento”

sábado, novembro 11, 2006

Arte: "Unauthorized Obsession" © George Grie
isca

a minha
poesia
é anzol
jogado ao acaso
no rio
dos teus olhos

© Ademir Antonio Bacca
do livro “O Relógio de Alice”
Arte: Fraga
“É ainda possível chorar
sobre as páginas de um livro,
mas não se pode derramar lágrimas
sobre um disco rígido.”

JOSE SARAMAGO
no fim das contas
a gente se vai do bar
assim como correm os rios:
sem pressa nenhuma
porque sabem que um dia
dão de cara com o mar.

nos vamos sem pressa alguma

o relógio às vezes atrasa,
mas o galo sempre acorda
as manhãs.

© Ademir Antonio Bacca
do livro “Plano de Vôo”
replay

o passado
de vez em quando
bate em minha porta
vestido de amanhã

© Ademir Antonio Bacca
do livro “Plano de Vôo”
é longa
a noite de poucos versos

os acordes do velho violão
pedem trégua aos corações cansados
mas o silêncio ao redor
não cala o grito
que vem de dentro do corpo

A trégua interrompe o sono
mas nunca quebra a magia do sonho.

© Ademir Antonio Bacca
do livro “Plano de Vôo”
Bósnia

plantam-se corpos
em valas comuns
como se homens
fossem sementes
de insensatez.

© Ademir Antonio Bacca
do livro “Plano de Vôo”

quinta-feira, novembro 09, 2006



Arte: Siegfried Zademack

não há pressa.

o coração dispara
mas o verso espera.


© Ademir Antonio Bacca
do livro “Pandorgas ao Vento”

eu guardo a minha dor
amordaçada dentro do peito.

é só para consumo interno.

dissolvo-a em doses cuidadosas
de emoções frustradas
e misturo-as a uma bebida amarga,
para que me seja difícil de tragar.

porque,
só embriagado de dor
é que descubro o quanto me custa
a minha insensatez

© Ademir Antonio Bacca
do livro “Pandorgas ao Vento”


Arte: "Blue Afternoon" by Kolja Tatic

“O poema é a sede que o desejo de uma sede maior sacia.
Num poema, o eco é tão importante quanto o silêncio.”

EDMOND JABÈS

armistício

nenhum gesto
que não acariciar
teu rosto

há em mim
intenções de sossego

nenhum movimento
que não desnudar
teu corpo

há em mim
intenções de paz
apesar da palavra
engatilhada

© Ademir Antonio Bacca
do livro “Pandorgas ao Vento”
Arte: Sabát


“Em meus textos, quero chocar o leitor,
não deixar que ele repouse na bengala dos lugares-comuns,
das expressões acostumadas e domesticadas.
Quero obrigá-lo a sentir uma novidade nas palavras.”

JORGE LUIS BORGES
1899-1986
das vantagens

percorrer
os caminhos
da emoção
não gasta
a sola do sapato

© Ademir Antonio Bacca
do livro “Pandorgas ao Vento”
nós

os
laços
que
nos
unem
são
os
mesmos
que
nos
sufocam
entre
nossos
lençóis.

© Ademir Antonio Bacca
do livro “Pandorgas ao Vento”
Arte: Morchoisne

“Pensamos em demasia
e sentimos bem pouco.mais do que de máquinas,
precisamos de humanidade.
Mais do que de inteligência, de afeição e doçura.
Sem essas virtudes, a vida será de violência
e tudo será perdido.”

Charles Chaplin
(1889 – 1977)

dos desatinos

a minha
é emoção desgovernada
que atropela a razão
em plena madrugada de criação.

o meu
é poema desastrado
que ganha as ruas,
se acovarda diante de ti
e não diz nada.

© Ademir Antonio Bacca

segunda-feira, novembro 06, 2006



Arte: Jacek Yerka

É sempre mais difícil
ancorar um navio no espaço

Ana Cristina César
1952 - 1983

das travessias

algumas pontes
levam minhas fantasias
ao outro lado do prazer.

outras,
só atravessam rios.

© Ademir Antonio Bacca
do livro “Pandorgas ao Vento”
Arte: Henrique Rodrigues Pinto
“O poema é uma bola de cristal.
Se apenas enxergares nele o seu nariz,
não culpes o mágico.”

MARIO QUINTANA
1906 - 1994

fonte de luz

a minha loucura
vem da nascente
dos teus olhos


© Ademir Antonio Bacca
do livro “Pandorgas ao Vento”


Concurso Nacional de Poesia

Tema: a cultura do vinho no cenário das civilizações
Regulamento no blog

http://arturgomes.zip.net

e na página:

http://www.almadepoeta.com/fulinaima.htm

invento a paixão
do meu jeito

irresponsável
e insensata
com todos os riscos

invento a minha paixão
com todas as loucuras
que passam pela cabeça
do mais tolo dos apaixonados
e me entrego a ela
de corpo e alma

só assim vale a pena
te amar


© Ademir Antonio Bacca
do livro “Pandorgas ao Vento”


As pitangueiras em frente ao SESC

Em frente à unidade do SESC, em homenagem ao Congresso Brasileiro de Poesia, a Secretaria Municipal do Meio Ambiente plantou, em anos alternados, duas pitangueiras. Para nossa alegria, tanto a maior quanto a menor delas, certamente em homenagem ao maior de todos os congressos já realizados, estão neste novembro que mal iniciou, carregadas de frutos. Peguei minha câmera e fiz um registro para dividir com todos os poetas que já participaram de plantios de pitangueiras em Bento Gonçalves, para que mesmo virtualmente, sintam o sabor das pitangas que embelezam nossos olhos.

das águas

no cristalino
das águas que descem
os morros
eu faço sumir os vestígios
do teu corpo

tempo que se vai
na pressa do rio

lembrança que não dói mais


© Ademir Antonio Bacca
do livro “Pandorgas ao Vento”
do aconchego

descanso
a insensatez
dos meus passos
na calma doçura
dos teus braços

sossego
a loucura
dos meus atos
na doce preguiça
dos teus gestos.


© Ademir Antonio Bacca
do livro “Pandorgas ao Vento”

sexta-feira, novembro 03, 2006

Arte: Tristan Schane
tempo de solidão

tempo
que não passa
novelo
que não se desembaraça
vela
que queima devagar

que não desata
lembrança
que não se perde na fumaça.

noite
que se arrasta.


© Ademir Antonio Bacca
do ponto final

eu
e tu
diga lá
o que fazer
de nós dois?

onde
o porto
para ancorar
estes corpos
cansados
de se navegarem?

eu
e tu
onde foi que perdemos
o mapa do sonho
que trazíamos
no coração?


© Ademir Antonio Bacca
do livro “O Relógio de Alice”

Arte: "Close this window" © Olbinski
na corda bamba

no tênue fio
que me prende
a ti,
faço malabarismos mil
para não te perder
de vista


© Ademir Antonio Bacca
do livro “Pandorgas ao Vento”
da paixão

materializo
todas as minhas
fantasias
na ternura
indisfarçada
do teu olhar


© Ademir Antonio Bacca
do livro “Pandorgas ao Vento”
sina

eu tenho
um verso
atravessado
na garganta
que me rasga
o peito
toda vez
que me ponho
a sonhar.


© Ademir Antonio Bacca
do livro “Pandorgas ao Vento”