domingo, setembro 17, 2006


© Sergei Aparin - My light house
encanto

debruçada na janela
a menina encara a lua
de frente

olho
no
olho

quem se renderá ao encanto
primeiro,
a lua ou ela?

© Ademir Antonio Bacca
do livro “Plano de Vôo”
Poeminha de esclarecimento

Sim,
Deus é brasileiro.

Só que numa noite dessas
saiu para comprar cigarros
e não voltou mais.

© Ademir Antonio Bacca
do livro: “Pátria Amada e Outros Poeminhas Insensatos”
Pátria amada – Canto número dois

Se te olho com olhos de afeto
é porque os fecho para a fome da tua gente.

Se falo com orgulho de ter nascido em teu berço
é porque esqueço por instantes os teus opressores.

Se te olho com olhos piedosos
é porque sei da minha impotência
para exorcizar os demônios que te corroem as entranhas.

Se te olho com olhos descrentes
é porque já não acredito nos truques
dos teus mágicos aprendizes.

Se te olho com olhos de censura
é porque não consigo esquecer
as milhares de sepulturas anônimas
que o teu solo esconde vergonhosamente.

Se te olho com olhos de pouca fé
é porque já não creio nos teus santos
e muito menos nos teus orixás.

Mas,
se insisto em te olhar com estes meus olhos cansados
é porque sei que já não tenho forças para carregar nas costas
as culpas da tua história.

© Ademir Antonio Bacca
do livro: “Pátria Amada e Outros Poeminhas Insensatos”
dos riscos de se dar soco
em ponta de baioneta

o sonho existe
como dois e dois
de vez em quando
não é quatro.

o medo existe
assim tão certo
como quem é vivo
algumas vezes
desaparece.

© Ademir Antonio Bacca
do livro: “Inventário de Emoções”

terça-feira, setembro 12, 2006

da inocência

o que teus olhos
não compreendem
o teu coração
não mente.

© Ademir Antonio Bacca
do livro “Inventário de Emoções”
das paixões

a nudez do teu corpo
é idéia que vaga solta
no campo da fantasia
abre portas,
ressuscita sonhos
e incendeia
as minhas emoções.

© Ademir Antonio Bacca
do livro “Inventário de Emoções”
La Violoncelliste © Juan Alberto
fim de caso

que o instante seja breve
mesmo que teus argumentos
tenham a fragilidade
dos castelos de areia
diante da onda do mar.

que o adeus seja rápido
como o corpo que

c
a
i

do andaime
sem proteção


© Ademir Antonio Bacca
do livro “Plano de Vôo”
um galo
desperta a manhã
ao longe
e seu canto mexe
sem querer
no baú de lembranças
do poeta desavisado
que não ousava imaginar
galos anunciando madrugadas
em meio a blocos de concreto.


© Ademir Antonio Bacca
do livro “Plano de Vôo”
límpidas e calmas
as águas
que brilham no azul
dos teus olhos

neles mergulho
medos e emoções
sem vontade alguma
de voltar à tona.


© Ademir Antonio Bacca
do livro “Plano de Vôo”

José Lins do Rego

No dia 12 de setembro de 1957, José Lins do Rego, pioneiro do romance social nordestino, morre aos 56 anos.
Lins do Rego foi advogado, jornalista, romancista, cronista e memorialista.
Ele nasceu no Engenho Corredor, em Pilar, na Paraíba, em 3 de julho de 1901.
Entre suas obras, destacam-se Menino de engenho e Riacho Doce.

quarta-feira, setembro 06, 2006

Arte: Édouard Manet

STÉPHANE MALLARMÉ
09/09/1898
18/03/1942
BRINDE

Nada, esta espuma, virgem verso
A não designar mais que a copa;
Ao longe se afoga uma tropa
De sereias vária ao inverso.

Navegamos, ó meus fraternos
Amigos, eu já sobre a popa
Vós a proa em pompa que topa
A onda de raios e de invernos;

Uma embriaguez me faz arauto,
Sem medo ao jogo do mar alto,
Para erguer, de pé, este brinde

Solitude, recife, estrela
A não importa o que há no fim de
um branco afã de nossa vela.

© Stéphane Mallarmé

Paulo Autran
No dia 7 de setembro de 1922, nascia Paulo Autran, um dos maiores atores brasileiros de todos os tempos. Aos 84 anos, continua levando o belíssimo monólogo "Quadrante" para todos os palcos brasileiros. É um dos poucos atores que não se deixou seduzir pelas luzes da televisão.
No mesmo dia, o Brasil ouvia a primeira transmissão radiofônica do país durante a Exposição Internacional do Centenário da Independência, realizado no Rio de Janeiro.
por acaso alguém aí ouviu um sussurro nas margens do ipiranga?

deitados
em berço esplêndido
nenhum gesto,
nenhum movimento
e nenhum grito
que não
o de um mísero gol.

© Ademir Antonio Bacca
do livro “Inventário de Emoções”
se cai
o muro de Berlim,
acaba a união soviética
e o mac-donald’s
invade a Rússia;

se vendem pedaços
da cortina de ferro
como souvenir
e os mísseis patriots
interceptam os scuds
nos céus de Israel,

então por quê
não cai o muro
da tua indiferença?

© Ademir Antonio Bacca
do livro “Inventário de Emoções”

terça-feira, setembro 05, 2006

Steve Irwin
O meu pé esquerdo aparenta ter bem mais anos do que tenho. Digo isso porque todos os velhos que conheço, a começar pela minha mãe, toda vez que o pé ou a mão, seja esquerdo ou direito, começa a doer, é porque vem coisa pelo caminho. No mínimo anuncia chuva. O meu, quando dói, geralmente é crise da artrite que me acompanha desde os 28 anos. De ontem para cá o meu pé esquerdo começou a doer e sei que não é do frio de quase zero grau que fez na madrugada e nem crise de artrite que se anuncia. Começou a doer depois que li nos jornais a morte de Steve Irwin no litoral da Austrália, vitimado por um ferrão de arraia. Logo ele, acostumado a conviver perigosamente com bichos do mar. Meu pé começou a doer porque assim como o poeta que me habita nas madrugadas insone, ele também tem memória e voltou ao tempo. Mais precisamente para uma tarde de julho de 1981, no interior de Goiás, quando numa pescaria tive a infelicidade de ser vítima do ferrão de uma arraia, não das gigantes como a que acertou o coração de Steve, mas uma carijó que fez um estrago danado no meu pé e fez primeiro com que eu conhecesse a dor na verdadeira acepção da palavra e depois, que me arrastasse durante meses até que a ferida cicatrizasse. Por muitos anos amaldiçoei aquele dia que me afastou das costumeiras pescarias no Rio Araguaia. Agora, lendo os jornais, descubro que tive mais sorte do que Steve e não sei se meu pé está doendo porque periga nevar a qualquer momento ou em solidariedade ao ambientalista que eu estava acostumado a ver na televisão enfrentando crocodilos, serpentes ou qualquer bicho que aparecesse na sua frente.

segunda-feira, setembro 04, 2006

A cadeira de Hemingway
Quem vai a Havana geralmente cumpre um ritual obrigatório: beber um 'mojito' na Bodeguita del Medio, que o escritor Ernest Hemingway tornou popular em todo o mundo. Lá, além de ser servido aquele que é considerado o melhor 'mojito' de toda a ilha e das paredes repletas de fotos de personalidades e mensagens deixadas pelos visitantes, tudo lembra o grande escritor. Pregada no teto de uma das salas, o maior troféu do bar: a cadeira que Hemingway costumava usar todos os dias enquanto bebia com os amigos. Reza a lenda que foi lá, entre conversas de pescadores, que surgiu a idéia do livro "O Velho e o Mar". Na primeira vez que estive em Cuba, para participar da Feira do Livro de Havana de 1998, fiquei hospedado no hotel "El Viejo y el Mar", que fica, não por coincidência, dentro da Marina de Hemingway.

sábado, setembro 02, 2006

Que toda palavra
nasça
da ação e da meditação.
Sem ação
ou tendência à ação
ela será apenas teoria
que está levando os jovens
ao desespero.

Se ela é apenas ação
sem meditação
ela acabará no ativismo
sem fundamento,
sem conteúdo,
sem força...

Presta honras ao Verbo eterno
servindo-te da palavra
de forma
a recriar o mundo.


© D. HELDER CÂMARA
07/02/1905 – 27/08/1999

sexta-feira, setembro 01, 2006

ARTUR GOMES

Mais um belo poema para vocês deste grande poeta dos Campos de Goytacases:

Flor do Pampa

essa flor aqui em minha boca
vermelha rosa que floriu nos pampas
traz a seiva de uma terra santa
que todo mês
fazendo sol ou chuva
floresce em vinho a uva
e tudo mais
que o amor fizer

esta rosa aqui agora
que espelha fina estampa
entre os meus dentes
pele e presente de uma musa
que traz nos belos seios
um poema em tua blusa
e na flor da pele
um nome de mulher
acordando de pé esquerdo

ainda hoje
bem cedo
doeu a ausência
do teu corpo
colado ao meu.

© Ademir Antonio Bacca
do livro “Plano de Vôo”
para não sucumbir à paixão
é preciso atravessar pontes

todas as pontes

principalmente aquelas
que não levam ao outro lado
do rio.

© Ademir Antonio Bacca
do livro “Plano de Vôo”
das traições

cuidado
com as palavras
ditas.

a memória,
de todas as mulheres
é a que mais nos trai.

© Ademir Antonio Bacca
do livro “Plano de Vôo”

Salvador Dali
Uma das grandes emoções que tive na vida foi ver de perto obras do grande Salvador Dali. Primeiro no Museu de Belas Artes de Montreal e dois anos, depois em Barcelona e no seu museu particular em Figueres. Difícil dizer qual dos seus quadros é o meu preferido, mas gosto muito deste, que tem como título "Sueño causado por el vuelo de una abeja alrededor de una granada, un segundo antes de despertar", óleo sobre tela de 1944.